sexta-feira, março 24, 2006

Grandes Aberturas # 17

Todas as pessoas que conheceram Franz Kafka na juventude ou na maturidade, ficaram com a impressão estar circundado por uma "parede de vidro". Estava ali, atrás do vidro transparentíssimo, caminhava graciosamente, gesticulava, falava, sorria como um anjo meticuloso e ágil, e o seu sorriso era a a flor derradeira nascida de uma gentileza que se dava e logo se retirava para se apagar e fechar ciosamente em si mesma. Parecia dizer: "Sou como vós. Sou um de vós. Sofro e gozo do mesmo modo que vós." Mas quanto mais participava no destino e no sofrimento dos outros, tanto mais se excluía do jogo, e aquela sombra subtil de convite e de exclusão a aflorar-lhe os lábios assegurava que nunca teria podido estar presente, que habitava longe, muito longe, num mundo que nem sequer lhe pertencia.

Pietro Citati - Kafka (Tradução de Ernesto Sampaio)

1 Comments:

Blogger Susana Viegas said...

Esta é de facto uma grande abertura de um grande livro que, colocando-se no ombro de um gigante, consegue ver muito longe.

segunda-feira, abril 10, 2006 11:31:00 da tarde  

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