quinta-feira, abril 20, 2006

MANUEL DE FREITAS

5 412971 117161


Tem cara de perder. Esta semana
voltou a não levar preservativos
e nunca mais comprou comida para o cão.
Se calhar divorciaram-se, e ficou ela
com o bicho. Só não percebo como é que
ele sozinho consegue beber tanto leite.
Perdeu também um pouco da arrogância
com que habitualmente me passava
o visa. Mas devia ser bonito, em novo.



*


5 601066 400640


A mulher ainda não meteu na cabeça
que não me pagam para psicanalista.
Eu sei que a velhice é lixada e que
a reforma dela consegue ser ainda mais
miserável do que o ordenado que me obriga
a mudar de sorriso várias vezes ao dia.

É o habitual do costume: bolachas, dois
ou três iogurtes, fruta - enquanto atropela
com lamúrias e reumatismos e pede outra vez
mais sacos (ela que até na produção de lixo
é pobre). Gostava de lhe poder dizer um dia
como detesto que me chame "menina"
com tão poucos dentes e catarro à farta.



*

8 410500 001100


Estou a ver o estilo: a folha de canabis
ao peito, os óculos de Foucault
não-li e uma devoção macrobiótica
tão estúpida quanto inquebrantável.
Esta gente custa - e o que é pior:
cheira mal. Assoa-se à manga
da camisola, cheio de ideologia
nos sovacos. E vem fazer compras
como se estivesse outra vez no Lux,
entre amigos abstémios que só
não legalizam a vida porque
ainda há limites para o mau gosto.



De Isilda ou a Nudez do Código de Barras